quinta-feira, 6 de outubro de 2016

SÃO BERNARDO E OS TEMPLÁRIOS - (I)


"Combinavam as funções do monge com as do guerreiro."


"O trabalho sob o título «Em louvor da Nova Milícia», é dirigido aos «Soldados do Templo» e a Hugo, seu chefe. Consta de treze capítulos além de um curto prefácio.


O capítulo de abertura expõe as vantagens desfrutadas pelos soldados da «nova milícia», que havia surgido na própria terra consagrada pela vida e sofrimentos do Redentor, com a missão de banir os filhos das trevas onde Ele outrora banira o seu soberano.

Aqueles cavaleiros de Cristo combinavam as funções do monge com as do guerreiro, eram igualmente peritos na utilização das armas materiais e espirituais, mantinham guerra permanente contra os inimigos visíveis e invisíveis, eram invulneráveis a todos excepto a si próprios, pois não receavam ferimento algum além do pecado, caminhavam para a batalha com a certeza infalível da vitória - vitória se vencessem o adversário, vitória mais gloriosa se tombassem na peleja.

São Bernardo pregando as cruzadas
«Providos de armas de toda a espécie, não receiam o homem nem o demônio. A própria morte, longe de ser temida, é o objectivo do seu desejo. Na verdade, o que poderá causar qualquer alarme àquele, quer na vida quer na morte, para quem 'viver é Cristo e morrer lucro' (FiL, 1, 21)? Fiel e gostosamente viverá por Cristo; no entanto, preferiria 'ser dissolvido e estar com Cristo, coisa bastante melhor' (ibid., 23). Avante, pois, soldados de Cristo, e com corações intrépidos, ponde em fuga os inimigos da sua cruz, confiantes em que 'nem a morte nem a vida vos poderão separar da caridade de Deus que existe em Jesus Cristo' (Rom., 8, 39). Em todos os perigos repeti para convosco as palavras de São Paulo: ‘Tanto se vivermos como se morrermos somos do Senhor' (Rom., 14, 8). Oh, como será glorioso o vosso regresso se vencerdes na luta! Quão abençoado o vosso martírio, se tombardes no campo de batalha! Alegre-te, intrépido guerreiro, se víveres e conquistares no Senhor. Porém, bastante maior motivo terás para alegrar-te, se uma morte de mártir te unir ao teu Senhor. A tua vida será, sem dúvida, fecunda em bem e plena de glória, mas a morte santa é algo muito mais precioso. Porque, apesar de serem abençoados aqueles que morrem com o Senhor (Apoc, 14, 13), quão grande não será a santidade dos que morrem por Deus? Indubitavelmente, 'é preciosa aos olhos do Senhor a morte dos seus santos' (Sal. 115, 15), independentemente do lugar onde ocorra, tanto no leito como em combate; mas, morrer em combate é a forma mais preciosa de morte, por mais gloriosa. Oh vida segura do soldado cristão onde a consciência nada tem a recear! Oh vida segura do campeão da cruz para quem a morte não contém horrores, mas é antes desejada por ele com ardor e bem-vinda alegria! Oh milícia de Cristo, verdadeiramente leal e santa, livre do duplo perigo a que estão expostos os beligerantes quando Deus não é a causa da sua luta! Aquele que combate por algum interesse temporal possui frequentemente motivo para temer que, ao matar o corpo do seu inimigo, imole a sua própria alma, ou que sejam destruídos o seu corpo e alma; visto que, no entender de um cristão, a derrota e o triunfo dependem não dos acidentes da guerra, mas do sentir do coração. Se a guerra for justa, o resultado não pode ser mau, tal como nunca será bom se ela for injusta, quer na sua origem como na sua finalidade. Aquele que, numa peleja injusta, ao tentar matar, é morto, perece como um assassino; mas se sobreviver e abater o seu inimigo, vive como um assassino. Todavia, é terrível ser um assassino quer na vida ou na morte, na derrota ou na vitória. Desditosa considero essa vitória na qual, embora vencedor do adversário, se é vencido pelo demônio, e constitui presunção proclamar que se conquistou um homem».

"Cordeiros na paz e leões na guerra."
Nos três capítulos seguintes, o santo traça uma comparação entre os cavaleiros mundanos e «Quem afirmará que é ilegal para um cristão recorrer à espada, quando o precursor do Salvador não proibiu aos soldados o uso de armas, mas lhes recomendou simplesmente que se contentassem com o seu soldo? (Luc. 3, 14)» Aqui o santo opõe-se a Orígenes e Tertuliano que entenderam a guerra e a profissão das armas proibidas pelos cristãos. «Portanto, que se desembainhem ambas as espadas, a espiritual e a material, e sejam brandidas na face do inimigo 'até que se abatam todos os perigos que se ergueram contra a sabedoria de Deus' (1, Cor., 9, 4, 5), que é a fé cristã, 'para que nunca digam as nações: onde está agora o teu Deus' (Sal. 114, 2)?... Não que os pagãos devam ser imolados, se por qualquer outro meio puderem ser impedidos de perseguir e oprimir os fiéis. Mas é preferível que sejam destruídos, do que 'a vara dos pecadores caia sobre os justos' de forma 'a que os justos não estendam as suas mãos para a iniquidade' (Sal. 124, 3)». O autor prossegue, enumerando as virtudes dos templários: as suas vidas irrepreensíveis, a obediência, a simplicidade e pobreza, a sobriedade, a devoção pelo trabalho, o respeito e estima mútuos, a aversão por jogos e desportos, a discrição no falar e desprezo pelos murmúrios, a coragem indômita que nunca descansa para atacar o inimigo, a brandura e fúria marciais que os tornavam cordeiros na paz e leões na guerra.
os templários, em desfavor dos primeiros, evidentemente. O cavaleiro mundano possui maior interesse pela exibição do que pela utilidade do seu equipamento; assemelha-se mais a uma dama garrida do que a um militar ansiando pela guerra. Aliás, as pelejas nas quais estes cavaleiros seculares costumam participar têm por origem vinganças, vanglórias ou conquistas de territórios; porém, morrer ou ser morto em semelhantes refregas é igualmente perigoso para as almas. Ao contrário, os soldados de Cristo sentem-se tão seguros se se mantêm de pé como se tombam nas lutas pelo seu Salvador, pois não representa pecado mas antes
mérito e glória provocar ou sofrer a morte por Cristo.

Seguem-se nove capítulos, versando cada um os objetivos ou lugares mais sagrados na Palestina: o templo, Belém, Nazaré, o Monte Olivete e o vale de Josafá, o Jordão, o Calvário, o Santo Sepulcro, Bethfage e Betânia. São, na verdade, nove belas meditações, repletas dos pensamentos que deviam ocupar os espíritos dos templários ao contemplares os diferentes cenários consagrados pelo labor e sofrimentos do Redentor.

Estas palavras do eminente abade retumbaram através da cristandade, atraindo súbita fama a Hugo de Payens e seus companheiros. Bravo Hugo! A vossa longa e dolorosa provação acha-se no seu termo. A ameaça da extinção está removida da vossa instituição.

Doravante a vossa dificuldade consistirá em conseguir albergar todos os voluntários ansiosos provenientes dos mais afastados recantos da terra cristã. Os vossos cavaleiros brancos tornar-se-ão (...) terror dos sarracenos e o seu estandarte será o mais venerado da Europa. Durante dois séculos sustentarão o choque das Guerras Santas, repelindo com coragem desesperada e com risco de 20.000 dos seus, a onda crescente do islamismo que ameaçou, ano após ano, romper os seus laços e varrer irresistivelmente a Europa. E então, ser-lhes-á concedida a dura recompensa da prisão quando o seu principal crime for a posse de riquezas e o principal acusador um monarca cobiçoso."


Fonte:
LUDDY, Ailbe J. Bernardo de Claraval. Lisboa: Editorial Aster, 1953, p.168-171.

Continua aqui.

MARIA SEMPRE!

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